sábado, 19 de dezembro de 2009

A FESTA DA NEVE EM SPRAY - O Natal da minha Terra - Brasil



Sim, existe Natal no outro lado da borda do mar. Um Natal estranho e desconfortável.

Cinco séculos depois de nos ensinarem sobre o ouro, o incenso e a mirra, parece que ainda não sabemos muito bem o que fazer com eles. Fica esse gosto estranho na boca de quem espera fruta no lugar de hóstia.

Faz um calor desgraçado nos dezembros brasileiros, mas as lojas se esmeram na decoração baseada em neve artificial e nas renas que jamais teremos por estas bandas. Os pais se endividam com presentes que os filhos nem vão gostar tanto assim e os sapatos (novos) das moças são sempre mais desconfortáveis que o necessário.

Nossos pinheiros de Natal são de um plástico frágil, que os ventos mais fortes derrubam sem esforço. As canções são traduções literais e mal feitas de uma Hollywood distante.

No Brasil de imensa variedade de credos, também há a terrível inevitabilidade do Natal, sua onipresença irrespirável, quer você seja cristão ou judeu, candomblicista ou hindu. Ignorar a data? Impossível, o Natal vai te achar mesmo assim.

Claro, existem as crianças que ainda escrevem cartas singelas e tentam flagrar o Papai Noel caminhando na ponta dos pés. Há os que vão no frio e no escuro doar um prato de sopa aos famintos e as preces dos que pedem com fé. Porém mesmo eles estão fadados a enfrentar o pior do Natal - a obrigação de estar feliz.

Não interessa se há um lugar vazio na mesa (que a morte vai deixar vago para sempre), as reticências dos solitários ou os rancores das famílias magoadas. No Natal, há que se sorrir. Felicidade agendada, com dia, hora e local pré-estabelecidos e inapeláveis.

Mas se um dia, por um milagre inesperado, o Natal puder ser refeito, eis minha proposta: sejamos mais lisos, mais francos e naturais. Se há alguma coisa que os trópicos têm a ensinar ao resto do mundo é esta cara lavada, bonita sem maquiagem, marcante sem afetações. Quem sabe assim podemos trocar o Natal das árvores de plástico por um mais simples, menos absolutista e mais espontâneo. Talvez um de verdade.

Escrito por Ana Claudia Pantoja, do blog Café das Ilusões

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9 comentários:

  1. Uma visão do Natal dura, um tanto cínica até, mas que não deixa de ser real no actual contexto de Natal pré-fabricado em função do consumismo.
    Apesar de tudo gostei do texto. Uma pedrada no charco das nossas consciências adormecidas.
    Um abraço e bom fim de semana

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  2. Olá, Ana!

    Afinal, no Brasil, sempre há um Natal diferente do Natal do Gramado. Sem espectáculo e onde a realidade nua e crua nos é apresentada. Claro que, infelizmente, não é só no Brasil. O mundo global está a perder a noção dos valores. Lá, como cá! E, de vez em quando, temos que "cair na real" (como dizem por aí).

    Tenha um Santo Natal!

    João Celorico

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  3. Gostei do texto, apesar de ser duro enfrentarmos a realidade. No Brasil como em Portugal, ou em qualquer outra parte do Mundo, o Natal tem sempre o lado positivo e o negativo, que, infelizmente, vai ganhando terreno.
    Tal como a Ana, fico à espera do tal milagre.
    Desejo um Natal verdadeiro e feliz.
    Beijinhos

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  4. Olhe sinceramente não sei se gostei ou não. Esse natal puro e espontaneo podemos sempre fazer, portanto...o meu é puro e espontaneo. Não tenho a tradição, por isso na minha familia fazemos o nosso próprio natal, com um bocadinho de tudo...até de discussões que são as coisas mais normais quando estamos todos juntos.
    Um abraço e espero que recupere um certo romantismo pela vida e FELIZ NATAL seja lá onde estiver ok?

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  5. Como diz a Elvira:«uma pedrada no charco das nossas consciências adormecidas»... mas é duro admitir que o Natal não é a fantasia que idealizámos ao longo dos anos...
    Por mim só acredito mesmo que há pessoas de boa vontade,em qualquer época do ano.
    E depois... por mais que barafuste, não consigo alhear-me completamente... porque estou viva e vivo em sociedade!!!
    Mas gostei que pusesse o dedo na ferida!
    Seja feliz em Dezembro e em todos os outros meses do ano!!!
    Um beijo
    Alcinda

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  6. É verdade que há um aspecto negativo no Natal.No entanto,quem é comerciante precisa dessas épocas para enfrentar a crise...e falo do comerciante pequenino,do tradicional que enfrenta as grandes superfícies...E como escreveu alguém e bem: o Natal fazemos nós em cada casa,com o que temos e pudemos,mas sobretudo com união,harmonia e Amor.E é verdade,em família,as vezes até discussões :p

    Jocas Natalícias!
    Lena

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  7. É, falta fibra ao Natal de hoje, em especial por aqui. Mas nos viramos com o disponível.

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  8. Muito realista o seu texto que tanto se aplica ao Brasil como a Portugal. Por estes dias enchem-nos os ouvidos com as "canções da época", na TV são programas absolutamente intragáveis dos natais disto e daquilo... e muitas outras coisas mais.
    Apesar de tudo, um Feliz Natal

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  9. Com os votos de Santo e Feliz Natal, aqui lhe deixo um poema de Miguel Torga.

    Natal divino ao rés-do-chão humano,
    Sem um anjo a cantar a cada ouvido.
    Encolhido
    À lareira,
    Ao que pergunto
    Respondo
    Com as achas que vou pondo
    Na fogueira.
    O mito apenas velado
    Como um cadáver
    Familiar…
    E neve, neve, a caiar
    De triste melancolia
    Os caminhos onde um dia
    Vi os Magos galopar…

    João Celorico

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