terça-feira, 24 de novembro de 2009

O MEU MAGUSTO



Estamos a chegar ao São Martinho, época de castanhas e prova de vinho.

Nesta altura, é vulgar complementar algumas refeições com castanhas. Em minha casa não fugimos à regra, mas olhando o meu assador, passam-me pela lembrança tempos passados na minha juventude, na aldeia natal da minha mãe, o Sobral Magro.
Fecho os olhos.

Vejo os divertidos magustos da aldeia. Grupos de rapazes e raparigas juntam-se num dos largos da povoação, num ambiente de grande alegria e animação. Para ali levam molhos de caruma que juntam num monte. Colocam-lhe por cima uma camada de castanhas que cobrem com uma outra camada de caruma. Por fim, ateiam-lhe o fogo.
De vez em quando, revolvem tudo com um pau, para que as castanhas se assem por igual, sem se queimarem.
Enquanto isso, alguns rapazes mais atrevidos, aproveitam para “deitar o olho” às raparigas que, envergonhadas, soltam risinhos nervosos.
Assadas as castanhas, todos se juntam em redor da fogueira já extinta e comem-nas em amena e alegre cavaqueira, intervalando com um copo de jeropiga ou de vinho. De cada vez que apanham castanhas da fogueira, ficam com as mãos enfarruscadas e alguns mais divertidos fazem festinhas nos outros, provocando grande algazarra, ao verem as caras sujas uns dos outros.
Quase sempre, um ou outro rapaz com dotes musicais mais apurados, traz consigo uma harmónica vocal ou uma concertina e começa o bailarico animado aqui e além pelas vozes afinadas dos cantadores da aldeia.

É este o meu magusto. Mas, ao abrir os olhos, acordo para a realidade. Na minha frente, continua o assador. Não há fogueira, nem rapazes, nem raparigas e, o único som que ouço, é a música da publicidade que passa na televisão.

Escrito por Lourdes Martinho, do blogue O Açor

Se gostou deste texto, vote nele de 28 a 30 de Novembro. Aproveite e comente. Quem sabe, é seleccionado para melhor comentário!

5 comentários:

  1. Olá Lourdes!
    Bonito texto.Sonhámos tantas vezes acordadas,como se estivessemos lá.
    Jocas gordas
    Lena

    ResponderEliminar
  2. Sonhar, faz bem e é fácil! Às vezes!!!


    Em fechando os olhos
    tudo nossa mente apanha,
    arde a caruma aos molhos
    onde se assa a castanha!

    Há raparigas envergonhadas
    e há os rapazes atrevidos,
    comendo castanhas assadas
    num magusto. Divertidos!

    Entre rapazes e raparigas
    torna-se a festa brejeira,
    cantam-se umas cantigas
    e alegra-se a brincadeira!

    Mas é preciso decoro
    ao pé do conversado,
    pode tremer o namoro
    e ficar “enfarruscado”!

    No sonho tudo é permitido
    porque nada daquilo é real
    e um magusto, divertido,
    é melhor que telejornal!

    Um conselho lhe vou dar!
    Ouça a minha opinião!
    Se quiser algo sonhar,
    desligue a televisão!

    João Celorico

    ResponderEliminar
  3. Um texto excelente. A Lurdes agarrou bem o tema, desenvolveu-o e não fugiu ao assunto. Não se limitou a exibir o púcaro das castanhas. Brincou, fechou os olhos e transportou-nos ao passado. Ficámos situados no tempo da sua história.
    Descreveu muito bem o magusto provinciano doutras eras, com uma envolvência popular genuína. Não faltaram ingredientes como aquele "deitar de olho" às raparigas, os "risinhos nervosos" e até o bailarico ao som duma harmónica de boca dum rapaz que, provavelmente, até usava uma boina espanhola com um pincarinho na cabeça, (digo eu).
    De repente, fez-me lembrar alguns cenários do clássico "Aldeia da Roupa Branca" com Beatriz Costa.
    No fim, todos acórdámos para a crua realidade duns anúncios rotineiros da TV, num tempo sem alma, sem harmónica de beiços, sem aqueles magustos!
    Foi sintética, objectiva e pintou bem o quadro.
    Gostei imenso do seu texto. Parabéns.

    ResponderEliminar
  4. Lourdes gostei muito do seu texto. Ele quase nos transporta para o"seu" magusto.Ao fim de alguns segundos também nós vemos as cenas correrem, como se de filme se tratasse...Tenho uma amiga que viveu na juventude esse magusto. Ela diz-me que enfarruscar as caras uns dos outros eram as carícias possíveis naqueles tempos.
    Boa sorte
    Alcinda

    ResponderEliminar
  5. Muito bonito o texto. Fico pensando nas memórias que temos e nos acompanham pela vida fora, de coisas tão bonitas como este Magusto que relata. E fico triste pelos nossos filhos e netos que nunca vão ter memórias assim.
    Um abraço e boa sorte

    ResponderEliminar