quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

VAMOS CANTAR AS JANEIRAS EM CORTECEGA


Rancho Folclórico de Cortecega

Janeiras são uma tradição muito antiga que vai passando de geração em geração. Na minha aldeia essa tradição manteve-se até há alguns anos atrás, mas em muitas aldeias de Portugal esta tradição está viva, felizmente!

Bem, vou contar como era no tempo em que vivia na aldeia onde nasci (Cortecega). Existia um grupo folclórico do qual eu fazia parte e por altura dos Reis lá ia-mos nós pedir as Janeiras. Na noite de Reis, formavam-se dois grupos de pessoas. Um grupo percorria as ruas da aldeia e o outro ia à povoação mais perto (neste caso a Cabreira) indo de casa em casa, cantando e tocando alguns instrumentos, como pandeireta, ferrinhos, tambor, concertina, desejando, assim, um bom ano aos seus vizinhos cantando quadras como estas.

Boas noites, meus senhores
Boas noites vimos dar
Vimos pedir as Janeiras
Se no-las quiserem dar
***
Aqui vimos, aqui vimos
Aqui vimos bem sabeis
Vimos dar as boas festas
E também cantar os Reis
Mas como a porta tarda em abrir-se…
Levante-se daí Senhora
Do seu banco de cortiça
Venha-nos dar as janeiras
Ou de carne ou de chouriça
***
Viva lá o Senhor António
Raminho de bem-querer
Traga lá a chave da adega
Venha-nos dar de beber
De uma maneira geral as gentes da casa acediam, e então tinham direito a agradecimento:
As janeiras que nos deram
Deus será o pagador
Queira Deus que para o ano
Nos faça o mesmo favor
Mas também podia acontecer “não haver nada para ninguém”. Então…
Cantemos e recontemos
Tornemos a recontar
Esta barba de farelos
Não tem nada para nos dar

Terminada a canção numa casa, esperava-se que os donos nos dessem as janeiras (castanhas, nozes, maçãs, batatas, carne de porco chouriço, morcela, porque tinha sido altura das “matanças”, etc.). Dinheiro não se dava, mas caso alguém o fizesse era para ajudar a comprar o que faltava paro o almoço de dia de Reis.
No dia de Reis o povo juntava-se no largo da aldeia. Preparava-se a lenha que tinha estado a arder no largo desde a noite de Natal, onde eram colocadas as panelas de ferros onde se cozia a batatas, a carne, as chouriças, dadas na noite anterior. Preparava-se as couves que ainda de noite tínhamos sido (desviadas da horta do vizinho) e em festa todos, bebiam e cantavam. No caso de alguém da terra não ter dado nada aquando do peditório, nós íamos ao galinheiro e (desviava-mos uma galinha), quem pagava as favas era a raposa, pois tinha sido ela que tinha ido a capoeira. A pessoa era convidada para a festa e só tempos mais tarde lhe era dito quem foi à capoeira (era uma risada).
Era uma confraternização que unia as pessoas e que hoje recordo com saudades. Muitas vezes são tema de conversa quando nos encontramos e revivemos o passado, principalmente no verão, altura de férias.

Escrito por Eugénia Santa Cruz, do blog Cortecega – Notícias da Minha Terra

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8 comentários:

  1. Com que então, assalto á capoeira dos vizinhos.
    Que grande dia de Reis com galinha, chouriços,carne de porco e tudo de produção caseira era uma grande festança. Pois é mas era mesmo assim. Era tudo muito mais divertido, Regra geral toda a gente cooperava. Pena tudo isto estar a acabar.
    Vamos vivendo das recordações, é sempre bom recordar.
    Um texto bem conseguido tão realista que nos faz recuar no tempo e imaginar estar a ouvir o cantar das Janeiras nas nossas lindas terras.
    Um abraço
    Acácio

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  2. Eugénia
    Mas que grande festa no Dia de Reis! Era um dos poucos dias em que se comiam petiscos tão saborosos,nas aldeias do interior.
    Um dia destes era mesmo para ficar na memória, pois um porco normalmente alimentava uma família durante o ano inteiro e, quando se proporcionava uma festa assim, tirava-se a barriga de misérias. Valia tudo, até mesmo roubar galinhas e convidar o dono.
    Gostei da descrição. Exceptuando alguns pormenores, é idêntica aquela que os meus pais faziam da sua aldeia natal.
    Beijinhos

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  3. Adorei a parte de "surrupiar" as coisas do vizinho,ihihihih...
    Bonito rancho :)

    Jocas gordas
    Lena

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  4. Não conheço, pessoalmente, as Janeiras! Quer-me parecer que é uma festa que se foi mantendo através dos tempos, graças ao felizmente e que servia, principalmente, para que os mais abastados disponibilizassem algum de seu para o benefício de muitos. Diria, quase todos! O povo, passado o Natal, sentia necessidade de ocupar o tempo com diversão, de modo a esquecer um pouco as agruras da vida (o trabalho devia escassear) e a inclemência da época.
    Posto isto, aqui fico umas Janeiras de ocasião!

    Em Cortecega, que piada,
    não há ninguém a ver mal
    se o vizinho não dá nada
    assaltam-lhe o quintal.

    Depois, todos, ao jantar,
    e sem que nada o pareça,
    a brincar, sempre a brincar,
    “comem-lhe as papas na cabeça”?

    Não é um processo ordeiro,
    a bem dizer, na verdade.
    Não é como o “inginheiro”
    que dá Nova Oportunidade!

    Nova Oportunidade, é bom
    e não sou eu que o nego,
    o currículo sobe de tom,
    só se mantém o desemprego!

    João Celorico

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  5. Nessa altura divertia-se de uma maneira, hoje temos de aceitar que há outras formas de divertir. Normalmente só achamos que é divertido porque recordamos a nossa juventude, e achamos que a malta de hoje não se diverte. Errado. Vejo pela minha filha mais velha que tem 14 anos como se envolve com as catequistas que são jovens de 17 e 18 anos e a maneira como fazem catequese, como falaram do dia de Reis o teatro que executaram aqui em Vila do Bispo, foi simplesmente maravilhoso!!!! Nada tradicional mas estava lá tudo, a história contada de uma maneira muito engraçada , divertida e sem fugir ao que nos foi ensinado.
    Os grupos que ouvi pelas ruas a cantarem as janeiras, gente jovem e também se divertiram.
    A tradição tal qual a conheceram está modificada mas continua super divertida.

    Nunca participei , mas acho as coisas feitas hoje muito mais alegres e soltas, do que noutros tempos, pois noutros tempos havia muitas necessidades que nestas alturas eram colmatadas. Tudo tinha um propósito.

    De quaquer maneira a todos parabéns pois acredito que tenham boas vozes e que não desafinaram eheheheh

    Beijinhos

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  6. Um texto elucidativo e bem esclarecedor de como as coisas aconteciam. Está espectacular! A lembrar algumas das "traquinices" a que asssisti e até ajudei a praticar em garota eheheh

    Bem me lembro das matanças e do tronco a arder no meio das ruas (a minha aldeia é dividida em 3 aglomerados de casas) mas não tenho ideia se também se traziam as panelas de ferro para a fogueira pública eheheh

    Gostei muito do texto e os versos das janeiras são muito engraçados

    Um beijo

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  7. gostei do texto muito orijinal

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  8. gostei do texto mas fas-me saudades desses tempos diz a manuela de cortecega um beijo grande

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