segunda-feira, 10 de agosto de 2009

Festas do Barreiro



Quando eu era menina, todos os anos ocorria um facto que nos deixavam muito felizes. Era em Agosto as festas em honra de Nª Sr.ª do Rosário no Barreiro. Dizer que nós éramos pobres é colorir a vida quase miserável que tínhamos. Mas uma ida à festa no dia da procissão, que acompanhávamos religiosamente, entrar numa taberna depois da procissão e comprar um melão para matarmos a fome, e ficar até ser noite para que as crianças vissem a iluminação do arraial, era sagrado para meus pais. E nós que vivíamos num velho barracão sem água nem luz, abríamos os olhos de espanto para todo aquele brilho que fazia a noite parecer dia. O carrossel, os aviões, o poço da Morte, as barraquinhas de venda, faziam-nos ficar parados, a sonhar…
Lembro-me do dia em que meus irmãos se vestiram de anjinhos, em paga de uma promessa feita pela minha mãe. Estavam lindos, apesar de os fatos muito simples terem sido emprestados, e das sandálias terem sido feitas pelo meu pai com cartão e tiras de um velho lençol. Engraçado que eu também queria ir vestida assim e meu irmão não queria. Lembro-me que pedi à minha mãe para ir no lugar dele e ela não deixou. Eles tinham estado doentes a promessa era para eles.
A procissão de N.ª S.ª do Rosário realiza-se no dia 15 de Agosto. Consta-se que no local da actual igreja, havia uma pequena ermida dedicada a S. Roque. Mais tarde passou para a Irmandade de S. Pedro, constituída pelos pescadores da vila. Como estes eram devotos da Virgem do Rosário, em breve começaram a festejá-la.
Com o terramoto de 1755 a pequena capela ficou quase destruída. Restaurada e ampliada, em breve era um dos principais pontos de romagem, da margem sul, tornando-se a capela pequena para tanto romeiro em busca de milagres. A imagem saía de Lisboa em barco, festivamente engalanado, e escoltado por inúmeros barcos de pescadores, em direcção ao Barreiro, que já se encontrava em festa para recebê-la. No final do séc. XVIII, D. Maria I emitiu o alvará que permitiu a construção da actual igreja. A procissão hoje só em terra, realiza-se a de Agosto.

Escrito por : Elvira Carvalho, do blogue : Sexta-feira
Festas de Nossa Senhora do Rosário do Barreiro

Se acha que este texto é o melhor, vote nele na caixa de votações da barra lateral ecomente aqui. Quem sabe sai daqui o melhor comentário do mês.

16 comentários:

  1. Olá Elvira:

    Atrás de uma festa, recordações de meninice muito emocionantes. Pena não teres sido anjo, mas acredito que todos os dias te vestes um pouco o fato que não pudestes vestir naqueles belo dia...

    Feliz dia de Blogagem!
    Desta vez, excepcionalmente as votações irão durar até 8 de Setembro, para que as férias não sejam uma desculpa para votar e participar.

    Bjs Susana

    ResponderEliminar
  2. Olá Elvira,
    as festas da nossa terra são sempre as melhores e as mais bonitas aos nossos olhos.
    Podermos hoje aprecia-las recuando no tempo e vermos a menina que fomos por entre a multidão, vivendo a festa com o entusiasmo próprio da idade, é só por si uma bênção de Deus.

    Gostei muito do seu texto, parabéns!

    Beijinhos,
    Ana Martins

    ResponderEliminar
  3. Ana Maria:

    Seja bem vinda e obrigada pela sua participação, comentando aqui. Esteja à vontade para comentar as vezes que entender, até dia 8 de Setembro. Quem sabe ainda seja escolhido o seu comentário, como o melhor.

    Bjs Susana

    ResponderEliminar
  4. Olá Elvira
    Concorreu com um lindíssimo texto, relatando de forma minuciosa uma sua história de vida e, também, as tradições da festa de Nossa Senhora do Rosário, no Barreiro. Aquele cortejo de barcos na travessia do Tejo devia ser emocionante! Defendeu o seu tema muitíssimo bem! Desejo-lhe a maior sorte nesta blogagem!
    Abraço
    José Pinto

    ResponderEliminar
  5. Querida Elvira, posso imaginar o quanto as tuas lembranças voaram para tão longe enquanto escrevias este texto. É como se vivêssemos um pouquinho daqueles dias e até o cheiro, os sons chegam até nós. As festas populares mudaram nos dias de hoje, ou fomos nós quem mudamos, mas tudo o que se viveu naqueles dias ficou guardado para sempre nos nossos corações.

    beijos Elvira

    ResponderEliminar
  6. Olá Elvira
    Adorei o seu texto, é sem duvida muito interessante,grandioso não só pelo seu conteúdo como a forma que foi elaborado.Está de parabens
    Abraço
    Acácio Moreira

    ResponderEliminar
  7. Susana:
    Obrigada pelo seu comentário e incentivo. Na verdade eu fui de anjo na procissão do Sr. dos Passos. Tinha poucos meses de idade, e fui ao colo de meu avô, para pagar a promessa que minha mãe fez, por eu não ter morrido antes de nascer com o susto que ela apanhou com o raio que decepou metade do pinheiro que estava sobre a barraca onde meus pais viviam. Por causa desse raio, na madrugada de 3 de Setembro, e do medo que a minha mãe teve, eu nasci nessa manhã, quando faltava quase 1 mês para o fim do tempo. Só que meus irmãos foram já crescidos e eu gostaria de ter ido naquela altura, já que como é evidente não me lembro de quando fui.
    Um abraço

    ResponderEliminar
  8. Ana Maria:
    Tem razão amiga. As nossas são sempre as melhores ainda que isso não seja verdade. Porque contêm um pouco de nós e da forma como éramos e vivíamos esse tempo.
    Um abraço e obrigada

    ResponderEliminar
  9. José Pinto:
    Obrigada amigo. Tem razão devia ser muito bonito. Pena que com a revolução industrial do principio do século passado, quando o Barreiro deixou de ser uma terra de pescadores para ser uma terra de operários, a procissão tenha passado a ser apenas em terra. Mesmo assim a procissão sempre foi muito bonita. Depois do 25 de Abril, tentaram mudar a procissão para o dia 7 de Outubro, já que no calendário religioso, esse é o dia em que se venera a Nª. Sª. do Rosário, que é a Padroeira do Barreiro. Mas foi um fiasco tão grande que logo voltou para o dia 15 de Agosto. Não se apagam mais de 300 anos de tradições impunemente.
    Um abraço

    ResponderEliminar
  10. Pitanga:
    É amiga, eu penso que foram as duas coisas. As festas mudaram alguma coisa e nós mudámos muito.
    E sabe o que sempre me admirou? É que sendo o Barreiro um dos locais onde há uma maior concentração de comunistas, a cidade sempre foi palco de grande religiosidade, e os seus habitantes sempre manifestaram um grande culto às coisas do céu. Talvez seja no País única nesse sentido.
    Um abraço e obrigada

    ResponderEliminar
  11. Acácio Moreira:
    Ainda bem que gostou, afinal a intenção de quem escreve partilhando com os outros sentimentos e recordações é de que quem lê goste.
    Um abraço e obrigada

    ResponderEliminar
  12. Olá Elvira,

    Sempre histórias reais que saem da sua escrita e eu sempre gostei dos heróis da vida real, mais que dos do cinema e dos contos de fadas e é impressionante que mesmo quando vou ao cinema são os argumentos da vida real, com mistura de drama e comédia os que mais me impressionam, são as lutas, as vitórias, sobretudo as vitórias sobre a adversidade que me comovem até às lágrimas, uma comoção pela positiva, porque a felicidade também se traduz pelas lágrimas.
    Depois o que me impressiona na sua história tão simples é isso mesmo, o ser simples, a alegria que se pode dar às crianças com tão pouco, apenas com o brilho de um dia, para já não falar no brilho de todos os dias que as crianças de hoje têm e na dificuldade que encontram em o apreciar, mas isso seria outra história para mais tarde contar...
    Por fim comoveu-me que a festa de Nossa Senhora do Rosário no Barreiro tivesse essa componente de ligação à zona piscatória. Fez-me voltar à adolescência onde tantas vezes acompanhei essas procissões de barcos, nas festas de Nossa Senhora da Bonança, em Vila Praia de Âncora, no Minho, em que a imagem de Nossa Senhora da Ínsua é trazida de barco desde a ilha da Ínsua em Moledo do Minho, uma bonita fortaleza no meio do mar numa pequena ilha e também escoltada por barcos de pescadores todos eles engalanados, que se realiza em princípios de Setembro.
    A fé dos pescadores comove-me e sinto de forma diferente e intensa estas procissões por mar ou rio, precisamente porque a sua vida é dura e estes dias têm um brilho diferente.
    Vou escolher sim a sua história para votar porque é uma história da vida real.
    Beijinhos

    P.S. Quero deixar uma nota para a Susana, pelo belíssimo trabalho que faz neste blog, tão válido e que nos enriquece e pedir-lhe desculpa porque o tempo disponível não tem facilitado que o conheça mais profundamente.
    Sinto uma admiração imensa pelo que faz e prometo voltar sempre que puder.
    Beijinhos para si.

    ResponderEliminar
  13. Que um comentário lhe deixe
    foi a tarefa pedida,
    por isso, amiga, não se queixe
    se não for à sua medida!

    Voltas e voltas à cabeça
    e melhor coisa não me sai.
    Mesmo que, amiga, não mo peça,
    o meu comentário, ele cá vai!


    Amiga “camarra”! Afinal,
    por sua escrita, não peca!
    Seu mestrado não lhe fez mal,
    apesar de tirado na “seca”!

    Li tudo e eu lhe digo,
    não está mesmo nada mau.
    São palavras de amigo,
    sem cheiro a bacalhau!

    São estórias de antigamente
    que a juventude desconhece.
    São as histórias de gente
    com menos do que merece!

    Sem que faça disto alarde,
    e sem nada eu pretender,
    talvez um dia, mais tarde,
    eles pensem e vão perceber!

    João Celorico

    ResponderEliminar
  14. Ora bem chegou o nosso vate. E como sempre muito inspirado. Pena que a mim me falte engenho e arte para responder à altura.
    Um abraço e muito obrigada.

    ResponderEliminar
  15. João Celorico
    Desculpe não ter colocado o nome mas a resposta anterior é para si.
    Um abraço

    ResponderEliminar
  16. Brancamar só agora reparei que ainda não agradeci o seu comentário, mas como falámos depois disso e lhe agradeci pessoalmente, espero estar desculpada.
    Um abraço

    ResponderEliminar