sábado, 20 de março de 2010

A ALDEIA DO MEU PAI

Sobral Gordo
(Imagem do site do Grupo Etnográfico Raízes de Sobral Gordo em http://sites.google.com/site/raizesdosobralgordo/)


O meu pai é natural duma pequenina povoação chamada Sobral Gordo, pertencente à freguesia de Pomares e ao concelho de Arganil.

Quando o meu pai nasceu, a vida na aldeia era dura. Vivia-se da agricultura em terrenos ganhos às vertentes íngremes da serra do Açor com a construção de socalcos. Transportavam os bens à cabeça ou às costas. Só os mais abastados possuíam uma mula ou um macho para servir de transporte A criação de gado complementava a alimentação e fornecia o estrume para as terras. Muito trabalho era comunitário e em tempo de dificuldade, ajudavam-se uns aos outros.

A aldeia não tinha estrada e, para onde quer que se deslocassem, tinham que o fazer a pé. Não havia saneamento nem electricidade e a água era transportada em cântaros da fonte para casa.

A roupa era lavada na ribeira e a higiene era feita em grandes alguidares com água aquecida em panelas de ferro na lareira. Não havia escola, e uma grande parte da população era analfabeta. Só alguns aprendiam a ler e a escrever, muitas vezes ao serão, com alguém que o soubesse fazer e se dispusesse a ensinar.

Desta forma, muitos dos habitantes da aldeia sentiram-se motivados para partir e uma grande maioria rumou para a região de Lisboa, em busca de trabalho. Alguns tiveram tanto sucesso nos seus empregos que conseguiram o seu próprio negócio.

Durante a primeira metade do século passado, gerou-se em Lisboa um movimento associativo dos naturais das aldeias beirãs, tão abandonadas pelo Poder Central, cujo objectivo era melhorar as condições de vida nas suas povoações. Nasceram Ligas, Uniões, Comissões e Associações de Melhoramentos, que com a sua contribuição, organização de festas e movimentação nos Ministérios em Lisboa, conseguiram iniciar uma nova era. Romperam-se estradas, electrificaram-se as povoações, distribui-se água ao domicílio, construíram-se redes de saneamento, escolas, casas de convívio, ringues desportivos....

A terra do meu pai não foi excepção e hoje possui as infraestruturas básicas das zonas urbanas, com a vantagem de poderem usufruir duma vida pura e saudável.

No entanto a maior parte dos naturais da aldeia acabou por criar raízes também na região metropolitana de Lisboa, mas todas as férias e tempos livres são dedicados à sua aldeia. Para manter mais vivas as tradições criaram um grupo etnográfico e tentam manter na memória os usos e costumes da aldeia que os viu nascer, organizando vários eventos ao longo do ano.

Com a memória do passado podemos, no presente, construir um futuro melhor...

Escrito por Lourdes Martinho, do blog O Açor

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8 comentários:

  1. Olá Lourdes
    Temos a percepção de ver um filme. É uma descrição extraordinária do modo de vida da sua aldeia, no tempo do seu pai. Tudo ao pormenor, com simplicidade e rigor, mas sempre em crescendo. As últimas imagens mostram uma povoação estruturada com muitas valências, mercê do trabalho dum movimento associativo de gente com garra! Impecável!
    Um beijo

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  2. Quando percebo esses movimentos em prol da cultura, das tradições, do resgate da História, vejo que a Humanidade ainda tem jeito.
    Mas é preciso que se vá longe para valorizar o que está perto.
    Assim caminha a humanidade, errando e aprendendo, sempre a procura do ideal.
    Parabéns pelo belo trabalho comunitário !
    Beijo

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  3. Olá Lourdes!
    é com realidade e conhecimento que descreve a aldeia que serviu de berço ao seu pai. Não esquecendo os difíceis tempos antigos vividos nestas aldeias do interior. Por outro lado prova a força e a vontade desta gente em vencer e melhorar o seu meio de vida. Conseguido muitas vezes através de muito trabalho e persistência, mas isso eram factores que esta gente não desprezava, e com grande arrojo e teimosia e venceram grandes obstáculos para a alcançar um melhor vivência do seu dia a dia
    Beijo
    Acácio

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  4. Todas as aldeias da Serra do Açor são lindíssimas e o expoente máximo(a minha opinião)é o Piodão.
    Toda a descrição está perfeita e o texto lê-se com muito agardo.
    Parabéns

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  5. Resgatar as tradições, memórias, culturas da Aldeia onde seu pai nasceu é gratificante.
    Parabéns pela beleza de texto, imagens belissímas.

    beijooo.

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  6. Querida Lourdes,

    Parabéns minha amiga pelo belíssimo texto.
    Não conheço ainda o Piodão, fiquei com muita vontade de visitar.

    Beijinhos.
    Voltarei para dar o meu apoio.

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  7. Olá, Lourdes!
    Como tenho andado arredio da Aldeia e chego com a Primavera, no Dia Mundial da Poesia, deixo, mesmo aqui, a minha contribuição!

    No Dia Mundial da Poesia,
    que anualmente se renova,
    muito mal me pareceria
    não deixar a minha trova.

    Não é do vento que passa
    a bem dizer, na verdade,
    esse calava a desgraça
    e esta só traz amizade.

    Estes versos que eu faço,
    feitos de alma bem cheia,
    levam assim o meu abraço
    à população desta Aldeia.

    E se da cabeça não me sai
    uma coisa menos confusa,
    foi porque no dia do Pai
    gastei toda a minha musa.

    Quero pois acabar em bem
    todo este meu arrozoado.
    Aquele que dá o que tem,
    a mais não é obrigado!

    Quanto ao seu texto, só tenho a dizer que aqui está mais uma aldeia daquelas que não tinha nada e precisava de tudo, apesar do muito trabalho, e que hoje tem quase tudo mas quase não precisa de nada e os seus filhos e descendentes tudo fazem para a não deixarem morrer. Bem hajam!

    Abraço,
    João Celorico

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  8. Olá Lourdes!
    Mais um maravilhoso local da região da Serra do Açor.É oficial:tenho um roteiro com 3 localidades: Carvalhal do Sapo,Sobral e Cortecega.E claro,não poderá faltar Piódão :) Quando for lá,aviso a Lourdes e os outros bloguistas que pertencem a essa bela zona,para nos juntarmos todos :)

    Jocas gordas
    Lena

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